Eu estava bem decidida que iria passar o ano novo no interior com minha família. Tinha torrado uma grana viajando para a África e depois no Brasil. Minha ideia era economizar com o réveillon, onde tudo sempre é mais caro, arrumar um freela como jornalista em Janeiro, juntar uma grana e depois viajar de novo.
Até que uma amiga, a maior companheira de viagens inesperadas que alguém pode ter, virou pra mim e disse “Você tem noção do quanto nosso ano foi especial, do quanto a gente viajou, do quanto nosso blog e mídias sociais cresceram? Guria, a gente tem que começar 2017 num lugar especial!”.
Sim… A gente tinha. Mas como, sem grana nem pra pagar uma passagem aérea decente?
Foi quando eu estava conversando com um amigo que começou uma volta ao mundo e… Bem, no meio dessa volta ao mundo ele foi passar três dias no Deserto do Atacama e esses três dias viraram, até o momento, três meses. Foi quando ele me disse que aqui era bem fácil de conseguir emprego. Eu comentei isso com a Paty, a que topa minhas aventuras, e ela resolveu ver quantas milhas seriam para viajar para Santiago do Chile (até então, faltava apenas uma semana pro Natal). E veio a bomba: apenas dez mil milhas! Velho, isso é muito poucoooo!
Em poucas horas decidimos que passaríamos o ano novo no deserto mais árido do mundo, emitimos uma passagem só de ida pra Santiago, compramos uma passagem interna de Santiago para Calama, contamos nossas moedas e embarcamos com o maior frio na barriga de todos os tempos para a minha primeira trip da vidaaaa em que eu ia praticamente zerada de grana.
Se eu contar que até lata de leite condensado e Nescau a gente trouxe pra fazer brigadeiro e vender, muita gente ia achar loucura. Mas só quem arrisca loucuras assim se surpreende. No primeiro dia os brigadeiros foram sucesso absoluto, vendemos todos, teve gente pedindo mais, e hoje estamos recebendo até pedidos pelo whatsapp e pelo Instagram! E eu, em dois dias, comecei a trabalhar na agência de turismo mais antiga de San Pedro do Atacama, a Colque Tours.
Sim, mudamos o rumo das nossas vidas em uns dez dias!
Me lembro de quando fui ao supermercado no Brasil com a minha mãe pra comprar os ingredientes pro brigadeiro. Me bateu uma nóia de “Cara, enlouqueci de vez! Tô indo vender brigadeiro no Atacama!”. Mandei mensagem para a Paty perguntando “A gente vai fazer isso mesmo? Porque eu estou comprando os ingredientes”.
Deixei o medo pra lá e hoje estamos aqui. A Paty segue vendendo os brigadeiros e eu estou ganhando uma super experiência trabalhando numa das melhores agências de Turismo do Atacama. No dia em que bati meu recorde de vendas na Colque Tours, a Paty conseguiu fazer quase metade da grana que eu fiz – sim, apenas vendendo brigadeiros.
Essa história aqui é mais uma daquelas que mostram que só não viaja quem não quer, e que não existe desculpa de tempo, dinheiro, companhia. Quem quer, vem. Nós viemos, e hoje estamos vivendo isso aqui e eu já quero prolongar o mês que vim passar em San Pedro de Atacama.
Aqui é seco. Minha pele está sofrendo, meu nariz, meu cabelo, minha respiração.
Tem muita poeira e nada fica limpo por muito tempo.
É uma cidade onde tudo fecha meia noite.
É proibido beber na rua.
É caro.
Já cheguei a trabalhar doze horas num dia.
Estou morando apenas em hostels – com patrocínio do Hostelworld <3 – e me mudando de um para o outro a cada quatro ou cinco dias para dar conta de conhecer todos até ir embora.
O estoque de tapioca que eu trouxe em breve vai acabar.
Mas a secura daqui não me incomoda – meu nariz ainda não sangrou, a pele do meu rosto na verdade está mais lisinha que nunca, tudo o que eu lavo seca em poucos minutos, não tem muitos bichos simplesmente porque muitos deles não sobrevivem a esse clima daqui. Obs.: Mas tem muuuuitos cachorros <3
A cidade é pequena. Mas já conheço todo mundo e não ando um quarteirão sem cumprimentar alguém.
E as leis rìgidas? Ah, para isso existem as festas clandestinas que rolam toda noite, os vinhos nos hostels, os intervalos de trabalho que quase sempre rendem uma cervejinha.
Trabalho muito! Mas trabalho de short, havaianas e óculos escuros. As 12 horas de trabalho? Cara, quem consegue parar de trabalhar quando está vendendo pra caramba e só vendo sua comissão do dia subir? Se você consegue parar, NÃO me ensine o segredo, porque quero continuar fazendo grana! Hahaha
Viemos só eu e Paty pra esse deserto, mas aqui conhecemos uma galera de brasileiros muuuuuito gente boa. Moram aqui, também trabalham aqui e estão na mesma vibe que a gente: fazer mais grana e viajar mais. E sempre rola aquela cervejinha, já teve churrasco, tour de bike à noite, fugidas no meio do expediente pra uma gelada, fora os planos de alugar carro, acampar no meio do nada, fazer trekkings, seguir junto pra Bolívia e por aí vai.
Eu já pensei em morar em muuuuuuitos lugares do mundo. Mas num deserto?? Definitivamente eu não tinha planos para isso. E quando eu planejei vir pra ficar só um mês aqui, não fazia nem ideia do quão pouco seria isso.
Antes de vir, eu tinha basicamente duas opções: esperar o ano novo, pegar mais um freela e trabalhar como louca no Rio economizando pra viajar depois. Ou vir de qualquer jeito e ir fazendo grana pelo caminho. Sei lá, foi meio espontâneo, as coisas aconteceram naturalmente, e eu fiquei com a segunda opção. E estou com um sério medo de ter descoberto o segredo pra viajar pra sempre.
Se você também tem esse sonho de viajar o mundo, avalie as possibilidades e não coloque qualquer desculpa como impedimento. Em 90% dos casos, nós somos os únicos responsáveis por não realizarmos os nossos sonhos.
Sim, a gente só vive uma vez. E se a gente viver direitinho, uma vez é suficiente.
E o Atacama está sendo DEMAAAAAAAIS!!!!!!!!!!!
Obrigada pela companhia em mais uma viagem <3