Fui Gostei Contei

Contos de viagem – Quando morar fora aperta…

Acabei de voltar dos correios, aqui ao lado da minha casa em Zapresic, na Croácia. Enviei, pra minha casa no Brasil, enfeites que eu trouxe dos Mercadinhos de Natal que acabei de visitar em Bratislava, Viena e Praga (olha essa foto aí em cima deles já na árvore). Enviei também chocolates – um deles da República Tcheca que se chama Carla. Cada pedacinho de chocolate vem com o meu nome escrito nele. Na caixa também foi um postal dessa mini cidade croata que hoje é o meu lar.

Mas o que me fez vir até o blog desabafar hoje foi a carta que eu enviei junto. Não esse postal fofo, mas uma carta que comecei a escrever querendo desejar Feliz Natal e contar da minha última viagem por aqui, mas, quando me dei conta, estava escrevendo a terceira página de papel ofício e molhando a tinta azul no papel de tanto que eu chorava.

Por que? Se estou vivendo um momento único na minha vida e estou realmente feliz. Por que? Se não é a primeira vez que deixo minha casa. Não é a segunda, não é a terceira, nem é a quarta. Não é o primeiro intercâmbio. Não é o segundo. É o terceiro. Por que? Se eu tenho aqui ao meu lado as melhores pessoas que eu jamais imaginaria encontrar na Croácia. Por que? Se a cada dia eu conheço um lugar mais incrível do que o outro.

Sobre esse vício em pegar a estrada.. {Croácia: meu próximo lar}

Dubrovnik, Croácia
Dubrovnik, Croácia

Porque tem hora que aperta. E não é só no bolso. No bolso também – e aí dá nó na cabeça, nos planos de viajar mais e mais. Mas é quando o nó aperta de jeito no peito e na garganta que a coisa complica e não tem cartão de crédito que resolva. Eu poderia dizer pra vocês que vir viver na Europa, mesmo que temporariamente, é moleza porque é a realização de um sonho. E é. Mas quando aperta…

Quando aperta, sufoca. Sufoca e, se não transbordar pelos olhos, se pelos dedos não virar palavra no papel, se eu não compartilhar no meu Microsoft Word, minha versão adulta do meu diário adolescente, sufoca que é de matar.

Lembro na infância de quando minha mãe, em outubro, já queria começar a montar a árvore de Natal (tô exagerando, mãe?!). Todo ano era assim, sempre foi assim. Ela, virginiana organizada que só, tinha todas aquelas bolas de vidro lindas guardadas em caixas para pendurar na árvore. E a gente ajudava no maior cuidado, pendurando uma a uma, até completar a árvore todinha. Com um anjo dourado no topo. E a casa inteira se enfeita de verde, vermelho e dourado. E o presépio com um cantinho especial, com palha de verdade na cômoda para ser o mais real possível. Esse ano eu vi apenas por fotos. Piscas-piscas nas varandas. Em novembro já começavam os planos do que preparar para o Natal – onde vai ser, o que vamos comer, quem vamos convidar. Que tal comidinhas personalizadas em estilo natalino?

Ai, como aperta. E aperta de sufocar. É meu primeiro Natal longe. É o nosso primeiro Natal sem minha vó (minha maior dor e perda durante esse intercâmbio). Quem vai fazer a oração à meia noite do dia 24 (era sempre ela, sempre)? É o segundo sem meu avô. E aqui, será que vai ter oração? E a entrega de presentes depois da oração? Será que aqui eles também dão algo comprado com o maior carinho e complementam com um “É só uma lembrancinha…”!? Será que eles também comem bacalhau, pernil, tender? Será que também colocam passas em tudo? E será que alguém reclama? Será que fazem o enterro dos ossos no dia 25 e depois também passam o dia inteiro juntos no sofá? Será que vou ouvir uma versão croata do “É pavê ou pacomê”? Será que vou me sentir como na minha casa de verdade? Será que ao menos vai ter neve pra eu me sentir num filme?

Natal de 2014, com meu irmão e minha avó linda!

Minha primeira vez no Couchsurfing – desculpa, mas essa é incomparável!

Será…

Será que vale a pena ver parte da sua vida passar de longe, como num cinema em versão miniatura no touchscreen do celular? Você, tão pertinho da tela, mas tão longe dos personagens. E sem direito a voltar a cena pra senti-la só mais um pouquinho. Só mais uma vez. Passou, já era. Você escolheu não ser coadjuvante lá. Mas o protagonista aqui. Isso tem consequências. E aperta… Aperta sem dó.

Ela me manda de lá.. Eu mando pra ela daqui..

É como eu escrevi na minha carta para casa. Não é fácil. Não é fácil virar as costas no aeroporto e entrar pra sala de embarque sozinho com sua família ficando pra trás. Não é fácil perder alguém especial e não ter a quem abraçar. Estar sozinho nos momentos em que você mais precisa de colo. Não é fácil transformar os novos amigos na sua família pra tentar tampar esse buraco enorme que fica dentro da gente. Não é fácil pegar um apartamento fechado há meses e transformar na sua nova casa. Encher a geladeira com seus novos ímãs de viagem pra, a cada novo copo d´água, se recordar dos motivos que te levaram até ali. Não é fácil ver os filhos dos seus amigos crescendo. Namoros se desfazendo e refazendo. Encontros e brindes que você nem mesmo soube que rolaram. Não é fácil quando tudo dá errado, quando você sente dor, quando vai pro hospital sozinho, quando precisa de ajuda, quando o dinheiro aperta, quando o facebook só reforça a distância, quando o whatsapp não é suficiente, quando cada foto recebida é a prova angustiante de um momento sem você. Não é fácil quando você almoça mais um sanduba e ele não tem o sabor daquele arroz com feijão preparado pela sua mãe (ou aquele bolinho fit de banana). Não é, gente.

Irmão, pai e mãe no Brasil. Mais uma foto recebida pelo Whatsapp <3

Mulher, viajante e independente: por que você deve, sim, viajar sozinha

Mas nunca vai ser. Nem mesmo se eu tivesse decidido ficar em casa e não vir. O peso talvez fosse muito maior. Eu iria transformar tudo em “E se”. Se eu tivesse ido, não repetiria esse prato de arroz com feijão hoje de novo, talvez estivesse experimentando um gelato na Itália, uma cerveja de Praga, um pita gyros na Grécia, um burek na Croácia ou na Bósnia ou na Sérvia, pratos que nem sei repetir o nome, um kebab em qualquer lanchonete de esquina. Caramba! Se eu tivesse ido, moraria num lugar sem trânsito e não teria que enfrentar a Ponte Rio-Niterói hoje de novo. Faria amigos incríveis, viveria outros encontros, brindes e namoros. Ia me jogar sozinha pela Europa, ia sair de casa de mochila nas costas sem planejar pra onde ir, ia me sentir a pessoa mais independente do planeta. Se eu não tivesse vindo, ia imaginar uma viagem perfeita sem braços quebrados, infecções nos rins ou perdas grandes. E isso ia doer também. E ia sufocar. Ficar só imaginando isso ia sufocar sem dó.

Por isso eu aprendi a aceitar minhas escolhas – é a maneira mais simples de ser feliz e estar bem consigo mesmo.

Mais uma estrada…

Minha aventura, sozinha, de trem pela Transylvania

Pai, meu leitor mais fiel do blog, quantas saudades eu estou de você. Estou perdendo o Natal, mas chego pro seu aniversário.

Mamish e irmão, que me visitaram aqui, duas semanas não foram suficientes. E nada substitui estar com vocês em casa.

Luninha, a cachorrinha mais carinhosa do planeta, segura a emoção na hora que eu entrar por essa porta e começar a subir a escada.

Chegou a reta final. Pra mim, no momento em que escrevo esse post, faltam dois meses. Um na Croácia, terminando meus estudos, outro viajando por aí. Mas até esse texto ir pro blog (vou ter que esperar meus presentes-surpresa chegarem no Brasil antes de postar, né?), o tempo por aqui será ainda mais curto.

Aguenta coração! E muita estrada ainda está por vir… Um Feliz Natal procês que vêm aqui ler minhas dicas e desabafos. E onde quer que vocês estejam, pertinho da família ou montando uma árvore de Natal do outro lado do mundo, que vocês façam dessa noite um momento mágico. E que venha por aí um ano cheio de novos caminhos e destinos e boas surpresas para todos nós <3 Sinto que 2016 promete! Vamos fazer a nossa parte e fechar 2015 com chave de ouro para receber um primeiro de janeiro cheio de boas expectativas?

“Que não tenhamos pressa, mas que não percamos tempo”. Boas festas! E obrigada pela companhia 🙂

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