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Diários da Pandemia: o cotidiano com coronavírus nos Estados Unidos

Estados Unidos

Diários da Pandemia: o cotidiano com coronavírus nos Estados Unidos

Os Estados Unidos dispensam apresentação. A maior potência econômica mundial é, mais uma vez, o foco das atenções. Mas agora por um motivo bastante preocupante. O país é, de longe, o que tem maior número de infectados e mortos por Covid-19 em todo o mundo.

No entanto, os norte americanos parecem indiferentes a esse dado alarmante. Com a chegada do Verão, parques e praias andam lotados de gente. Os campings foram reabertos. Os bares estão lotados. Há ainda a orientação por parte do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que se faça o menor número de testes de coronavírus possível. O objetivo seria esconder o número real de infectados.

Para termos uma visão mais real de como tem sido o dia-a-dia nos EUA e a convivência com o alastramento do número de infectados e mortos por coronavírus, convidei a Angélica para compartilhar seu relato vivendo nos Estados Unidos.

Quem é a Angélica

Meu nome é Angélica, sou de São Paulo, tenho 30 anos e me mudei para os Estados Unidos em Novembro de 2018. Atualmente moro na Cidade Fall River no Estado de Massachusetts. Estou a 75km de Boston e a 330km de Nova York. Sou Farmacêutica, fui secretária municipal de Saúde de Buri (SP) e trabalhei em diversos hospitais. 

Após uma conversa há uns anos atrás quando conheci a Carla em Curitiba, a idéia de viver meus sonhos veio mais forte em minha mente. Precisava me arriscar, conhecer o desconhecido e seguir meu coração. Foi quando em 2018 saí do meu emprego, deixei uma parte da minha família no Brasil e, após 15 anos longe, vim morar com minha mãe, irmã e sobrinhas aqui nos Estados Unidos. 

Quarentena instalada nos Estados Unidos

Em Fevereiro desse ano, a cada vez que ligávamos os noticiários, ouvíamos falar do Covid-19 e seu aumento crescente aqui nos Estados Unidos. Quando em Março por fim a pandemia se instalou, minhas aulas na universidade passaram a ser on-line, assim como as aulas na escola das minhas sobrinhas. Os trabalhos começaram a dispensar os funcionários e realocar seu horário de trabalho e mais pessoas começaram a trabalhar em esquema homeoffice. 

Ficaram abertos apenas os postos de combustíveis, redes de supermercados, farmácias e os drive thru dos restaurantes. Os mercados, por exemplo, começaram a alterar seus horários de funcionamento e limitar o número de pessoas dentro – hoje existe uma fila do lado de fora com marcas no chão de 6 passos entre uma pessoa e outra. Em Massachusetts é obrigatório o uso de máscaras em todos os lugares. 

A vida com o coronavírus nos Estados Unidos

No início senti que foi um medo e uma incerteza geral, todas as pessoas com quem conversava, ou até mesmo quando ia nos mercados, estava todo mundo aflito.  As pessoas usavam máscaras e luvas para sair na rua e, se viam alguém vindo em sua direção, desviavam. Até então ninguém sabia ao certo do que se tratava a doença em si.

O maior absurdo que eu vivenciei aqui foi certamente o caos instalado e as pessoas fazendo estoques de comida, papel higiênico, produtos de limpeza e água. Foi necessário começar a limitar a quantidade permitida por pessoa do que poderia comprar. Por exemplo, máximo de dois fardos de água por pessoa, porque muitas pessoas, como idosos ou até as mais necessitadas, não estavam encontrando suprimentos básicos para comprar. Esse egoísmo foi difícil pra mim, pois parecia que o mundo estava acabando e era cada um por si.

Reabertura da economia dividida em três fases

O estado de Massachusetts foi o terceiro mais afetado em número de casos no país quando a pandemia se instalou. Até que o governo local decidiu, no dia 17/03, fechar as fronteiras do estado. Aqui nos Estados Unidos o sistema político é diferente, uma vez que a autonomia de decisão fica a critério de cada governador de estado.

As novas diretrizes norte americanas recomendam que os estados registrem uma “trajetória decrescente” de 14 dias antes de iniciar um processo, em três fases, de reabertura. Para que seja possível transitar de uma fase para outra, uma série de itens deverão ser observados, como a realização de testes em massa e o cumprimento de critérios pré-estabelecidos no plano. Leia essa matéria do G1 que detalha as 3 fases de reabertura da economia propostas por Donald Trump.

A decisão sobre o fim das quarentenas fica sob responsabilidade de cada governador. Hoje, dia 06/07, iniciamos a fase 3 de reabertura no estado de Massachusetts.

Veja aqui o site do governo de Massachusetts com todas as fases e informações necessárias sobre a fase de abertura

Mapeamento e rastreamento de casos de Covid-19

Nos estados de Massachusetts e Rhode Island, que estão muito próximos, não estão sendo feitos testes em massa. É normal que pessoas que moram num estado trabalhem no outro, ou que atravessem de lado para ir ao supermercado, por exemplo. E isso pode confundir os dados de ambos estados.

O que está acontecendo hoje aqui em Massachusetts é uma tentativa de rastreamento dos casos ativos de Covid-19. Na prática funciona assim: se eu procurar o sistema de Saúde e for comprovado que estou infectada, eles farão uma lista das pessoas com quem eu tive contato na última semana e solicitarão que as mesmas façam o teste. É o jeito que eles arrumaram de tentar mapear e prevenir o aumento dos casos.

Até o momento, Massachusetts conseguiu reduzir o número de casos, o que é muito bom. Por outro lado, há outros estados norte americanos com avanço rápido de contágio, como a Flórida, Nova York, Califórnia e o Texas. De acordo com matéria recente do jornal El Pais, os casos de Covid-19 seguem aumentando em 40 dos 50 estados norte americanos.

Sistema de Saúde norte americano

Entre os países ricos, os Estados Unidos se destacam por serem um dos únicos que não oferecem a seus trabalhadores benefícios como licença médica, férias remuneradas ou licença maternidade. Outro obstáculo no combate ao coronavírus é o fato de que mais de 27 milhões de pessoas nos Estados Unidos não têm seguro de saúde e o país não tem um sistema de saúde universal gratuita – como, por exemplo, o SUS no Brasil.

Leia mais sobre os desafios na esfera da Saúde nos Estados Unidos nesse excelente artigo da BBC

Nos Estados Unidos é obrigatório por lei todas as pessoas terem plano de saúde. Até mesmo, quando se faz o imposto de renda, é necessário apresentar o comprovante do plano para o contador. Como uma exigência legal.

Dívida milionária com o governo em caso de internação

Minha maior preocupação aqui é pegar o Covid-19 e precisar ficar internada no país. Porque quando você necessita atendimento e chega no hospital com uma urgência ou emergência, você é atendido. Não existe negligência. Você pode ser imigrante, ter documento norte americano ou não, ter plano de saúde ou não, não importa, você será atendido. Porém se seu plano não cobrir aquele atendimento, se prepare que a conta irá chegar na sua casa – e costumam ser valores exorbitantes. 

Veja o caso do Michael Flor, sobrevivente do Covid-19 e que recebeu uma conta de US$ 1.122.501 de hospital nos EUA depois de passar dois meses internado em centro médico de Seattle

Por isso vejo o quanto nós, brasileiros, devemos valorizar o SUS. Com todos os problemas que temos, políticos e econômicos, no Brasil ainda é um sistema que funciona. Não é perfeito como deveria, mas funciona e você não paga nada por isso.

Consultas por telefone e videoconferência

No entanto, alguns estados norte americanos oferecem uma espécie de serviço de saúde pública, mas com cobertura bastante limitada. Em Massachusetts, por exemplo, existe o MassHealth, ainda uma herança do governo Obama, mas que é mais como uma atenção básica de saúde. Atende clínica médica, odontológica e fisioterapia. No entanto, se for algo mais complexo, não há cobertura e o paciente terá que arcar com todos os custos do tratamento. 

Ainda falando em Saúde, quando a pandemia se instalou aqui, clínicas médicas e odontológicas foram fechadas. E se você precisasse de algum atendimento que não fosse de emergência, o que fazer? Isso aconteceu comigo. E, acreditem, todas as consultas estavam sendo por telefone ou facetime. Dependendo do que o médico ou o dentista diagnosticassem, eles te atenderiam presencialmente, passariam um remédio para buscar na farmácia ou até mesmo recomendariam a emergência do hospital.

No meu caso, eu tive um problema com meu siso. Meu dentista fez o primeiro atendimento por telefone e passou um remédio que não resolveu meu problema. Só então ele me atendeu pessoalmente. Eu fui usando máscara e luvas. Assim que fui entrar, o segurança me parou, confirmou meu nome, mediu minha temperatura, pediu para eu trocar a máscara que eu estava usando e as luvas também. Além disso, me deram um relatório para preencher com centenas de informações, se saí do pais, se tive contato com paciente contaminado, se apresentei febre ou algum sintoma.

Em conversa com os funcionários, tanto da Saúde quanto de outros estabelecimentos que estão funcionando, hoje é obrigatório medir a temperatura, utilizar máscaras e fazer higienização completa das mãos antes de iniciar suas atividades de trabalho.

Vida voltando à normalidade – mas não tão normal

Na maioria dos lugares aqui em Massachusetts há capacidade máxima de pessoas em locais fechados. No supermercado Walmart, por exemplo, só podem entrar 25 pessoas por vez. Também foram instalados vidros de proteção, onde o atendente tem que utilizar máscara, mas ele fica atrás do vidro para evitar o contato com os consumidores.

Os corredores dos supermercados estão sinalizados, com fileiras de mão única. É obrigatório, também, manter 6 passos de distância entre uma pessoa e a outra. Essa semana aproveitei pra tirar as fotos abaixo, que exemplificam melhor o que mencionei.

A chegada do Verão nos EUA

No começo da pandemia, com o medo e a insegurança, e também por ser início da Primavera aqui, o clima estava agradável para ficar em casa e as pessoas estavam se cuidando muito mais. No entanto, com o tempo passando e o Verão se aproximando, e também as pessoas não aguentando mais ficar fechadas, elas estão começando a sair, fazer caminhadas na rua, ir aos parques, às praias, aos bares.

Vejo que as pessoas em certo ponto deixaram de se preocupar com a doença e só querem aproveitar. Para nós, por exemplo, o Verão é extremamente curto, são somente 2 a 3 meses de calor intenso. Como consequência, está havendo superlotação em alguns lugares. E os casos continuam crescendo de uma forma muito rápida, o que é realmente preocupante.

Esse artigo do El Pais revisita a trajetória do coronavírus nos EUA e relata o clima de normalidade instaurado em meio ao aumento de infectados

Turismo nos Estados Unidos

Na verdade, o Turismo interno no país nunca parou, nem as fronteiras entre estados foram fechadas nos Estados Unidos. Os voos internos continuam ativos, porém com capacidade reduzida de passageiros e tripulantes. Viagens de carro também estão permitidas e os campings foram reabertos.

No entanto, há restrições para quem deseja entrar no país. Hoje só podem entrar nos EUA: cidadãos norte americanos, residentes permanentes, diplomatas , estudantes ou a assuntos específicos.

Coronavírus nos Estados Unidos hoje

Hoje, dia 06/07, os Estados Unidos têm 2.932.047 pessoas infectadas, dos quais 878.993 se recuperaram, e 132.007 mortes por Covid-19. Considerados os casos oficiais e as mortes, a taxa de letalidade do vírus nos EUA é de 4,5%. O maior pico de novos casos de coronavírus foi registrado no dia 4 de julho, data comemorativa mais importante do país, quando foram confirmados 57.718 novos infectados pela doença.

A economia americana, que antes da epidemia tinha crescimento estável na casa dos 2% e chegara a níveis de pleno emprego, mergulhou em uma recessão que jogou a taxa de desemprego em quase 15% em apenas três meses. Tudo isso, em ano eleitoral.

Leia mais nessa excelente matéria da BBC, que destaca, ainda, o salto do número de infectados por Covid-19 em estados republicanos

Entenda a proposta da série de artigos Diários da Pandemia

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